Venicius Rodrigues
Nos últimos anos, o número de seguidores nas redes sociais se tornou um capital simbólico poderoso, capaz de abrir portas no mercado de trabalho, impulsionar carreiras e até mesmo ampliar vozes em debates públicos. No entanto, por trás dessa dinâmica, esconde-se uma lógica de exclusão, na qual apenas certos perfis conseguem converter sua presença digital em influência real. A ascensão da estética "Clean Girl" é um exemplo de como tendências aparentemente universais reforçam barreiras sociais e raciais na era digital.
A estética "Clean Girl" sugere um visual minimalista, pele iluminada, cabelos bem alinhados e roupas em tons neutros. Vendida como sinônimo de sofisticação e cuidado pessoal, essa tendência rapidamente se consolidou entre influenciadores e marcas. Mas, longe de ser apenas uma escolha estética, ela carrega consigo um padrão excludente.A pele clara, os traços finos e o corpo magro são características predominantes entre as referências dessa estética, tornando a inclusão de outras identidades uma exceção, e não a regra.
Embora o discurso da "beleza natural" seja central nessa tendência, a realidade é que manter esse visual exige um alto investimento financeiro. Produtos de skincare importados, maquiagens leves de marcas renomadas e roupas com cortes precisos fazem parte do arsenal necessário para alcançar o look desejado. Esse custo elevado exclui grande parte da população, enquanto influenciadores que já têm acesso a esses produtos — muitas vezes de forma gratuita, por meio de parcerias — acumulam ainda mais seguidores e oportunidades comerciais.
Nas redes socias, influenciadores mostram etapas de cuidados com a pele de uma "clean girl"
Foto: Reprodução/X
Além da exclusão econômica, há também um impacto direto no engajamento digital. Criadores de conteúdo que fogem desse padrão encontram maior dificuldade para crescer e se destacar. Algoritmos das plataformas tendem a favorecer conteúdos que já são populares, o que perpetua a visibilidade de um único tipo de estética e limita a diversidade de representações. Assim, quem não se encaixa nesse modelo recebe menos curtidas, menos compartilhamentos e, consequentemente, menos reconhecimento e oportunidades dentro do ambiente digital.
Essa lógica de exclusão também afeta a autoestima e a percepção de pertencimento de muitas pessoas. Para quem não se vê representado na estética "Clean Girl", a sensação de inadequação pode ser inevitável. Além disso, mesmo quando marcas tentam incluir influenciadores diversos em suas campanhas, essa inclusão muitas vezes acontece de forma superficial, sem questionar as estruturas que mantêm certos padrões no topo.
Fora do Tiktok, usuários passam a reclamar dos efeitos do novo padrão viral
Foto: Reprodução/X
O que essa tendência evidencia é que, no mundo digital, o número de seguidores não é apenas um reflexo da qualidade do conteúdo produzido, mas também do quanto alguém se encaixa em padrões estéticos e sociais pré-estabelecidos. Enquanto esse ciclo não for rompido, a influência digital continuará sendo um privilégio acessível a poucos, e o poder dos seguidores seguirá reforçando desigualdades já existentes na sociedade.
O problema, claro, não é a existência de tendências, mas a forma como elas se tornam barreiras invisíveis para quem não se encaixa em seus moldes. O espaço digital, que deveria ser plural e democrático, acaba funcionando como um clube exclusivo onde poucos têm real influência. Se quisermos romper com essa lógica, precisamos questionar as referências que consumimos, valorizar outras narrativas e ampliar a diversidade de vozes que têm espaço nas redes.