Isabel Queiroz
Detox de stories, ganho de histórias
Detox. Com certeza, você já ouviu essa palavra por aí: suco detox, dieta detox, desafio de detox. Embora esses termos geralmente sejam relacionados à alimentação, outros conceitos também existem, como “detox emocional” e “detox de redes sociais”. Todos esses compartilham um denominador em comum: o ato de desintoxicação, ou seja, a eliminação de toxinas do organismo com o objetivo de alcançar um funcionamento mais saudável.
Não é de hoje que se discute como, entre os benefícios e os avanços tecnológicos proporcionados pelas redes sociais, os malefícios do uso contínuo e exagerado dessas plataformas resultam em consequências para a saúde mental e física. Entre os mais frequentes, estão problemas de autoestima: gerados pela comparação constante que as redes fomentam, cresce o número de casos de assédio moral e até aumento de doenças psicológicas, como depressão e ansiedade. Apesar disso, no último levantamento sobre uso das redes sociais, publicado pela Comscore, o Brasil, que perde apenas para a Índia, ocupa a posição de 2º maior consumidor de redes sociais do mundo, com 132.5 milhões de usuários conectados, totalizando 344 bi de minutos consumidos e 92% de alcance por mês.
Recentemente a ex-youtuber e jornalista, Julia Tolezano, conhecida como “Jout Jout”, falou pela primeira vez sobre sua decisão de abandonar sua carreira no auge do sucesso, quatro anos após o hiato. No podcast “De Saída - A Vida Fora da Internet”, apresentado por Chico Felitti e Beatriz Trevisan, ela contou que a decisão partiu da sensação de “não ter mais o que falar”. Jout Jout acredita que não sabia mais com quem estava falando, apesar das métricas e de teoricamente ter acesso ao seu público alvo, conhecer as personas que a acompanhavam não significa entender, de forma individual, quem é cada pessoa.
Depois de anos gravando vídeos cheios de personalidade e opiniões, Julia contou que não se sentia mais realizada no ambiente online, mas anunciou uma volta diferente: encontros presenciais. Segundo ela, praticar o “cara a cara”, compartilhar e escutar, é uma forma de sair da falsa percepção de proximidade que a internet pode proporcionar, para realmente estar presente de uma forma mais intimista e pessoal.
A nova biografia no instagram da ex-Youtuber traduz seu novo estilo de vida
Adicional à pausa das redes sociais, Jout Jout decidiu se mudar para uma cidade pequena, morar um tempo na roça: viver em uma casa sem sinal de rede e até sem banheiro. Longe do contato externo por um tempo, ela optou por recomeçar a vida, afastando-se não apenas das plataformas, mas também da internet de forma geral. Embora essa atitude seja extrema e inviável para a maioria das pessoas, ela se alinha ao conceito de detox. Claro, não é necessário seguir essa mesma abordagem, mas o objetivo permanece o mesmo em todas as vivências: redirecionar a energia que muitas vezes gastamos em horas rolando a tela — diversas vezes, sem um interesse genuíno no que estamos consumindo — para algo mais significativo.
Ainda que permanecer offline pareça uma proposta interessante, para muitos, esse estilo de vida parece mais distante que nunca, considerando a migração, não apenas da vida pessoal, mas também da vida profissional para as redes sociais. Atualmente, a necessidade de ter um perfil profissional é como um pré-requisito, para algumas áreas mais que outras. Não apenas uma graduação, uma especialização, um curso ou anos de experiência, é como se o mercado de trabalho exigisse sua presença online para validar a competência do seu trabalho. Para Ícaro, de 22 anos, essa questão se torna um empecilho na sua vida. O estudante de engenharia da computação conta: “Hoje em dia o que me impede de realizar esse detox é a certeza de que eu não voltaria de jeito nenhum a usar as redes sociais, porém eu estou num momento de construção de carreira e sei que, possivelmente, as redes sociais serão ferramentas que terei que usar em algum momento para consolidar minha carreira de forma eficiente”.
Em contrapartida, para quem tem essa oportunidade, a experiência pode ser capaz de mudar diferentes âmbitos da vida, Emilly, de 20 anos, relata que ter ficado 6 meses sem Instagram em 2023 foi um período de reconexão com sua melhor versão: “A minha cabeça estava muito cheia, e existe uma grande massa de informações nas redes. Tem toda uma questão de estética e aquele sentimento de estar atrasada quando se compara com outras pessoas. Na época eu voltei até a fazer coisas que eu gostava muito, coisas que eu nunca mais tinha feito e com pessoas que eu gostava. O maior benefício que eu tive foi a minha preocupação com a minha espiritualidade. Apesar de não ser de religião nenhuma, eu me sentia na obrigação de melhorar o meu bem estar. Voltei a meditar, a me olhar com mais carinho também, cuidar da minha criança interior. Me alongava quando eu acordava, quando eu ia dormir, meditava o tempo todo e eu acabei ficando mais sã das minhas ações, e eu trouxe essa prática de volta para a minha vida”.
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Apesar de ter começado com o termo “detox”, outras expressões, como “jejum de dopamina”, têm ganhado popularidade com o mesmo propósito: abandonar vícios para conquistar uma vida mais saudável. Influenciadores como Rafael Gratta, são conhecidos por abordar esse tema. O “jejum de dopamina” consiste em evitar a chamada “dopamina barata”, associada ao prazer instantâneo proporcionado por vícios como jogos, pornografia e má alimentação.
O objetivo dessa prática é reconfigurar o cérebro, transferindo a sensação de recompensa dopaminérgica do prazer imediato para o processo e o resultado de atividades mais construtivas. Em conclusão, tanto o detox quanto o jejum de dopamina compartilham a meta de redirecionar a energia antes consumida em telas para outras áreas da vida. Essa prática busca promover uma rotina mais saudável e produtiva, eliminando as chamadas “toxinas digitais” do nosso cotidiano, como parte de um processo de desintoxicação mental.
Edição: Leo Prado e Thyffanny Ellen
Editor-chefe responsável: Rodrigo Junior