Eduardo Santana
Quando o medo foge do controle
VOCÊ JÁ TEVE ALGUM MEDO QUE PROVOCA PÂNICO TOTAL?
Em geral, o medo é uma reação natural que nos ajuda a escapar de perigos dono cotidiano. Se você se deparar com uma cobra, por exemplo, seu corpo automaticamente entra em alerta para evitar o contato e garantir a segurança. O psiquiatra francês Christophe André, no livro “Psicologia do Medo”, diz que trata-se de uma emoção com intensidade controlada, que tem mais chances de diminuir caso seja enfrentada. Mas nem todo medo segue esse padrão; alguns se tornam tão acentuados que viram verdadeiras patologias.
É o caso das fobias, medos intensos e difíceis de vencer. Elas são um tipo de transtorno de ansiedade que faz com que a pessoa sinta um medo irracional e descontrolado de algo específico, seja um objeto, situação, animal ou até uma tarefa comum do dia a dia. Diferente do medo normal, que vem e vai conforme o perigo passa, a fobia é persistente e desproporcional. Quem tem não consegue evitar o pânico, o que pode atrapalhar muito a rotina e afetar a qualidade de vida.
Luiza Amaral, 21, estudante de Psicologia, é uma das pessoas que enfrentam medo excessivo, mais especificamente de sapos, desde a infância. Ela relata que sua fobia começou durante uma viagem à casa de praia, quando confundiu um sapo com uma peça de cerâmica usada para decorar quintais. “Eu fui encostar, mas não achava que era o animal. Ele fez aquele negócio [coaxou]. Acho que isso desencadeou [a fobia] porque eu fiquei chorando a viagem inteira”. A estudante expõe que isso afeta diretamente seu dia a dia, especialmente ao usar as redes sociais. “Quando me mandam uma figurinha ou reels, vídeo, qualquer coisa, eu fico muito perturbada, muito ansiosa, em pânico. Só de falar o nome me dá ânsia”.
Os impactos desse transtorno podem ser prejudiciais à saúde e à vida de quem os tem. Georgina Bispo, 43, supervisora administrativa, possui uma fobia um tanto peculiar: o medo da flor do maracujá. Ela conta que, quando era criança, viu a flor se abrindo enquanto estava bem próxima e isso a assustou. A partir desse momento, passou por situações difíceis devido à descrença das pessoas em relação ao seu medo. “Quando eu tava grávida da minha primeira filha, meu ex marido achou que era brincadeira. Ele pegou um ramo seco da flor [do maracujá] e eu corri muito. Quase perco o bebê”.
Georgina aos 10 anos
Foto: Arquivo Pessoal
A fobia também impacta a vida de Luiza de tal modo que ela não consegue frequentar os lugares onde o animal esteve, mesmo que ele já não esteja mais presente. “Eu vou pra outro local e fico trancada até passar a sensação ruim. Se for na minha cozinha, eu passo fome porque vou ficar um tempo sem ir.” De acordo com Christophe André, considera-se os medos patológicos e as fobias como resultado de uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Eles se manifestam por diversos sintomas, como ataques de pânico, tremores, sudorese fria, além de uma ansiedade antecipada, que leva à tentativa de esquivar-se desses medos.
Evitar e fugir das situações que desencadeiam as fobias são estratégias comuns entre pessoas que sofrem desse transtorno. Esse comportamento serve como uma forma de proteção contra o confronto, mas varia de pessoa para pessoa. Enquanto algumas, como Luiza, evitam essas situações ao máximo, outras buscam enfrentá-las. Livia Rios, 21, estudante de Odontologia, é um exemplo. Seu medo excessivo de lagartixas fez com que evitasse dormir em seu próprio quarto por saber da presença do animal. Contudo, ela lida com esse medo dentro de suas limitações. “Tenho tentado enfrentar dependendo do tamanho dela. Mas, quando é uma lagartixa muito grande, eu não consigo”, revela.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2017, o Brasil ocupava a liderança mundial em termos de prevalência de transtornos de ansiedade, com 9,3% da população sofrendo deste mal, incluindo diversas fobias. Além disso, um estudo realizado pelo Instituto Cactus, em parceria com a AtlasIntel, revelou que mais da metade dos brasileiros nunca buscou ajuda de um profissional de saúde. Essa ausência contribui para a baixa adesão ao tratamento desse problema. Livia menciona que nunca pensou e nunca procurou qualquer tipo de terapia para superar o medo de lagartixas.
Com os avanços da medicina, os tratamentos para fobias têm se expandido, com destaque para a terapia de dessensibilização e a hipnoterapia como abordagens mais promissoras. A terapia de dessensibilização envolve a exposição gradual da pessoa fóbica à situação que a aterroriza, podendo contar com o uso de realidade virtual para facilitar esse processo. Por outro lado, a hipnoterapia utiliza técnicas hipnóticas para explorar as causas dos problemas enfrentados e encontrar maneiras de superá-los. Essa abordagem é reconhecida por diversos conselhos profissionais nas áreas de Medicina, Psicologia e Odontologia.
Luiza conhece algumas abordagens para tratar fobias e está considerando a hipnoterapia como uma opção para enfrentar esse medo. “Eu quero fazer hipnoterapia. Não que eu queira segurar um sapo na mão, mas que eu não tenha tantas emoções, tantas reações. É algo que penso bastante porque me incomoda muito”, desabafa a estudante de Psicologia. Embora não esteja ciente de opções de tratamento, Georgina conta que também considera abordar esse assunto na terapia. “Quando ia ao psicólogo não cheguei a fundo, mas eu penso em voltar a fazer pra tocar nesse assunto.”
As limitações impostas à vida das pessoas que enfrentam esses medos intensos e persistentes são diversas. Ainda que, como Georgina, algumas pessoas lidem com uma fobia um tanto fora do comum, uma rede de apoio próxima se demonstra essencial durante situações difíceis:“Minha família e amigos entendem. ‘Tem pé de maracujá, não deixa Gina entrar’. Onde tem o pessoal me avisa. Assim me sinto mais tranquila”.
Edição: Thyffanny Ellen
Editora-chefe responsável: Bia Nascimento