Izabela Prazeres
Pressão estética, influência digital e os riscos invisíveis dos cosméticos irregulares
Nos últimos meses, vídeos de “achadinhos” de maquiagem se tornaram rotina nas redes sociais. São iluminadores inspirados em marcas caras internacionais como a Rare Beauty ou bases com embalagens semelhantes às da Fenty Beauty, além de glosses que imitam marcas brasileiras, como a da influenciadora Franciny Ehlke. Séruns falsos, que prometem resultados milagrosos, também são comercializados. Todos mencionados são vendidos por preços muito abaixo dos originais, muitas vezes sem selo de autenticidade, registro sanitário e qualquer garantia mínima de segurança.
Tradução: A forma como essa marca copia descaradamente a Rare Beauty é impressionante
Foto: Reprodução/Redes Sociais
O fenômeno vai além da busca por produtos baratos. Ele expõe a pressão por pertencimento que atravessa as estéticas virais e o consumo impulsionado por influenciadores. Para um público majoritariamente jovem, acompanhar tendências de beleza passou a integrar a identidade digital, e os cosméticos falsificados acabam funcionando como um passaporte simbólico para esse universo, ainda que carreguem riscos à saúde.
Nas plataformas de venda rápida, como o novo TikTok Shop o e o Mercado Livre, já se vê a oferta crescer em ritmo acelerado. Embalagens que imitam com precisão itens de luxo dificultam a distinção entre o original e o falso. O preço é o principal atrativo: produtos que custariam cerca de R$ 150,00 aparecem à venda por valores entre R$ 30,00 e R$ 50,00. A popularização se intensifica com vídeos de “antes e depois” e testes feitos por influenciadores, muitas vezes sem qualquer menção à ausência de regulamentação.
A discussão ganhou um novo fôlego após a repercussão de um vídeo da influenciadora e empresária Franciny Ehlke. Nas imagens, ela percorre lojas de rua, compra produtos falsificados com sua marca e expõe diferenças em relação aos originais. Em um dos trechos mais comentados, a influenciadora flagra uma embalagem sendo montada manualmente no balcão, no momento da venda, evidenciando a informalidade da prática e a falta de controle sanitário.
A gravação gerou reações polarizadas. Enquanto parte do público reforçou os alertas sobre os riscos dos cosméticos falsificados, outros internautas saíram em defesa da prática, argumentando que os preços elevados das marcas originais justificariam o consumo de versões irregulares. Diante da naturalização desse tipo de consumo nas redes, especialistas alertam para os riscos que não aparecem nos vídeos. Para Elma Castro, biomédica esteticista, o uso de cosméticos falsificados ou sem registro sanitário preocupa pela frequência e pelos possíveis danos à saúde. “Usar produto falsificado é um risco enorme, porque a gente nunca sabe o que realmente tem dentro daquele frasco. Pode ter substâncias tóxicas, alergênicas ou até proibidas. Os danos vão desde uma irritação leve até queimaduras químicas, infecções e manchas que depois são super difíceis de tratar”, afirma.
Internautas criticam o posicionamento da influenciadora
Foto: Reprodução/Redes Sociais
Segundo ela, a pele costuma ser o primeiro sinal de que algo não está certo. Ardência, coceira, vermelhidão, descamação, sensação de queimação, inchaço ou surgimento de manchas indicam que o produto deve ser suspenso imediatamente, com orientação para buscar avaliação profissional.
Apesar dos alertas, o mercado paralelo segue em expansão. Entre consumidores, a justificativa recorrente é o acesso limitado às lojas oficiais e o impacto direto da influência digital. A estudante Rayssa Paz, de 21 anos, relata a dificuldade de encontrar produtos de marcas conhecidas em canais regulares. “Foi o lugar mais fácil que eu tive pra achar aquilo ali. Por exemplo, um contorno da Ruby Rose eu comprei na Shopee porque não achava nas lojas oficiais, e nem encontrei loja oficial da Ruby Rose”.
Ela reconhece que as redes sociais influenciam diretamente suas escolhas. “A maioria das coisas que eu compro na Shopee e TikTok foi por influência ou propaganda de alguma coisa.” Apesar de afirmar que nunca teve reações alérgicas, Rayssa aponta a pressão estética como um fator determinante. “Estou tentando parar de consumir um pouco, porque isso está me fazendo comprar coisas que não preciso. Eu acho que devo ter, já que fulana usou, deu certo com ela, ficou bonito”.
Cosméticos que Rayssa sem regulamentação pela internet
Foto: Acervo Pessoal
O consumo de cosméticos falsificados pode refletir desigualdades de acesso e um ambiente digital que estimula a performance constante de uma beleza globalizada. É possível que, ao mesmo tempo em que se promova sensação de pertencimento, esse cenário exponha consumidores a riscos pouco visíveis e fortalece um mercado que opera à margem da regulação.
No centro desse movimento, persiste uma questão fundamental: até que ponto vale arriscar a saúde para acompanhar a tendência do momento?
Edição: Thyffanny Ellen
Editora-chefe responsável: Bia Nascimento