Rodrigo Junior
Se lugar de mulher é onde ela quiser, as mulheres do século XXI querem estar em tatames, dojos e ringues. As Shena, She-ha e Mulher Maravilha foram substituídas por ícones como Ronda Rousey, Beatriz Souza e Amanda Nunes. As guerreiras da vida real aposentaram as espadas e escudos e vestiram os kimonos, faixas e luvas para passar a marcar presença em esportes de luta como jiu jitsu, taekwondo e karatê.
Ronda Rousey, primeira campeã do Mixed Martial Arts, as Artes Marciais Mistas ou MMA, nocauteou os paradigmas de que luta não era para mulher e, desde 2013, inspira mulheres a fazer parte deste universo. O Ultimate Fighting Championship (UFC), a organização responsável pelo MMA, constatou uma crescente de 60% nas lutas anuais femininas. Os dados divulgados pela organização em 2022 revelaram que em quase 10 anos, o total de combates subiu de 40 para mais de 65.
Bruna transformou usou a dor do bullying como motivação para começar a lutar
Foto: Acervo Pessoal
A representatividade é um fator que contribui para a presença de mulheres nesses ambientes. De acordo com a psicóloga Lilian Saturnino, o sentimento de identificação é um dos principais pilares para a construção da identidade pessoal. “Quando as pessoas veem indivíduos semelhantes a elas em posições de destaque ou em narrativas positivas, isso pode reforçar a autoestima e a autoeficácia”. A busca pelos esportes de luta aumentou pelos mais diversos fatores, como contribuição para saúde física e mental. O combate ao bullying fez com que a busca também aumentasse. Esse é o caso de Bruna Stefanny, que há nove anos pratica jiu jitsu. A estudante do ensino técnico em enfermagem buscou a luta após passar por situações de desrespeito pela sua baixa estatura e sobrepeso. Hoje, aos 21 anos, entende que a escolha contribuiu não só com a perda de peso, mas para a segurança como mulher.
O levantamento do Anuário Brasileiro de Segurança Pública constatou que 1,2 milhão de mulheres foram agredidas em contexto de violência doméstica, ameaça, perseguição (stalking), violência psicológica e estupro em 2023. Esse tipo de esporte faz que as mulheres se sintam mais preparadas para se proteger. “É muito melhor a gente saber e não precisar, do que precisar e não saber”, explicou a dona de uma faixa roxa, segunda graduação de um atleta no esporte.
A paixão pelas artes marciais também está muito ligada ao autocontrole e reordenamento mental. No caso da professora de taekwondo Maíra de Sena, que está no esporte há quase 23 anos, as práticas de luta a fizeram aprender a lidar com o Transtorno de Déficit de Atenção (TDAH) e ansiedade. “É uma questão de saúde, de equilíbrio, de autocontrole, o taekwondo me ajudou muito com a concentração”. Quando fala da importância da presença das mulheres nesses ambientes, ela acredita que os 14 anos de faixa preta a ajudaram a entender que "a arte marcial vem agregar, com mais propriedade, a questão da confiança sobre transitar em certos lugares e pontos, de não ter e nem ser inibida por olhares ou por outras questões".
A origem das artes marciais é diversa. No Japão, China, Índia ou Brasil, uma característica em comum sempre foi a ausência de mulheres na prática. Milhares de anos depois, as guerreiras têm garantido seu lugar. Além de treinar, dão aula, ganham medalhas e conquistam cinturões. Na luta para conquistar um espaço igualitário, os paradigmas jogam a toalha e a vitória é delas.
Disciplina e autocontrole ajudam a professora de taekwondo a lidar com TDAH e ansiedade
Foto: Acervo Pessoal
Edição: Bernardo Maia e Thyffanny Ellen
Editora-chefe responsável: Bia Nascimento