Izabela Prazeres
Na discussão sobre trabalho, alguns pontos sempre entram em debate: tempo de deslocamento, falta de flexibilidade, custos de alimentação e transporte, entre tantos outros. Com a chegada do home office, muitos desses problemas foram, em parte, solucionados. No entanto, ao mesmo tempo em que trouxe vantagens, o modelo também abriu espaço para novos desafios. Surge então a questão: será que ele é o herói ou o vilão da vida profissional?
A pandemia representou uma grande reviravolta na forma de trabalhar. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados em setembro de 2023, o número de ocupados no setor privado que exerciam suas funções em casa chegou a 6,9 milhões em 2022, um aumento de 2,4 milhões em relação a 2019, ano anterior à Covid-19. Esse crescimento foi impulsionado principalmente pelo distanciamento social obrigatório e pela redução de custos para as empresas, como energia, aluguel e manutenção.
Mas o home office também transformou as relações de trabalho. Entre os efeitos negativos mais apontados estão o aumento da ansiedade e dos problemas de saúde mental, causados pelo isolamento; a dificuldade em separar vida pessoal e profissional; os custos individuais com internet, alimentação e equipamentos; além da tendência de estender a jornada diária além do limite.
A experiência de Giovana Souza, 21 anos, moradora do Rio de Janeiro e estagiária de Psicologia Hospitalar no Hospital Municipalizado Adão Pereira Nunes, mostra o outro lado da moeda: o peso do deslocamento. Todos os dias, ela gasta cerca de três horas para ir de casa, na Tijuca, até Saracuruna, onde trabalha. “Quase toda semana enfrento problemas no transporte público. Mesmo saindo bem cedo, muitas vezes não chego no horário por causa da distância. E isso também me atrapalha na faculdade à noite, já que costumo me atrasar para as aulas”, conta.
O impacto vai além da pontualidade. Segundo Giovana, o trajeto longo e cansativo afeta diretamente sua disposição e produtividade.
“Sempre penso em começar a praticar atividades físicas, mas preciso abrir mão disso para não comprometer o trabalho e a faculdade. Nos dias em que me atraso, o desgaste fica ainda mais evidente e sinto que meu desempenho cai bastante”, afirma.
Distância do trajeto que Giovana faz de casa até o estágio
Foto: Reprodução/Apple Maps
Apesar da adesão inicial, o trabalho remoto vem perdendo espaço. Empresas como Dell, Amazon e Nubank anunciaram o retorno ao presencial, motivadas, entre outros fatores, pela insegurança em relação à produtividade. De acordo com levantamento feito pela plataforma de recrutamento Gupy, em 2024 foram registradas mais de 1,25 milhão de ofertas de vagas presenciais, contra menos de 250 mil híbridas ou totalmente remotas.
Nesse cenário, o modelo híbrido tem se consolidado como uma alternativa de equilíbrio entre os interesses de empresas e funcionários. Segundo a pesquisa “O Cenário do RH no Brasil”, da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), 46,6% das empresas já operam de forma presencial, 46,2% adotam o modelo híbrido e apenas 7,3% mantêm equipes totalmente remotas.
Para Cecília Bispo, 22 anos, estudante de Direito que atua em formato híbrido, a combinação dos dois mundos é o que faz sentido. “É importante ter a praticidade, flexibilidade e autonomia do home office, mas também a interação e a produtividade que o presencial proporciona”, afirma.
Registro de Cecília trabalhando em modelo home office
Foto: Arquivo pessoal
A adaptação, porém, não foi apenas para os trabalhadores. As empresas também precisaram rever processos e estruturas para atender às novas demandas do mercado, equilibrando custos, engajamento e resultados em meio a um cenário que ainda parece longe de um consenso.
A discussão sobre o futuro do trabalho permanece aberta, em meio a tentativas de conciliar produtividade, bem-estar e os novos hábitos adquiridos no período de isolamento.
Edição: Gabriel Freitas e Thyffanny Ellen
Editor-executivo responsável: Leo Prado